Para Pais

O que a matemática pode te ensinar sobre como lidar com o problema de drogas do seu filho

Raphael Mestres
Escrito por Raphael Mestres

Mesmo que você prefira jiló a matemática, você vai entender e nunca mais esquecer isso

Imagine um jovem que quer se tornar o melhor jogador de basquete do mundo.

Quero que você avalie quais as chances desse jovem alcançar o seu sonho. Vou te dar algumas informações para ajudar.

Ele tem os seguintes fatores a favor dele:

  1. Talento nato: tem 2,5m de altura, é rápido, habilidoso, pula muito alto e, desde que se lembra, foi o melhor jogador da sua cidade natal
  2. Apoio: vive em uma cidade que reverencia o basquete e foi criado por pais que se importam com os objetivos dele
  3. Histórico: foi eleito o jogador do ano em um torneio muito competitivo entre universidades
  4. Uma ótima perspectiva de futuro: foi selecionado em segundo lugar em um teste para jogar no internacionalmente famoso time da NBA, o Boston Celtics

Parece que a possibilidade existe e não está tão distante assim, não é?

Mas vamos acrescentar mais uma informação:

  1. Ele desenvolveu a dependência de cocaína

Quais são as chances dele agora?

Um único elemento pode colocar a perder todos os outros que o aproximavam de seu sonho, não?

Acontece que esse não é apenas um exercício intelectual, é o caso real de Leonard “Len” Bias que, dois dias depois de ser selecionado para o Boston Celtics, morreu de arritmia cardíaca induzida por uma overdose de cocaína, em 1986.

Esse exemplo introduz a uma ideia central no tratamento dos problemas relacionados a drogas:

A dependência química é um sistema multiplicativo

Hein?

Calma. Eu sei que isso não quer dizer nada para você ainda, mas lendo o texto até o final você vai entender exatamente o que isso quer dizer.

E mais, garanto que nunca mais vai esquecer o significado disso.

Peço licença, mas vou precisar acionar alguns gatilhos traumáticos criados na época de escola, com relação à matemática. rs. É por uma boa razão.

Resolva essa equação, por favor:

3 x 5 x 10 x 4 x 27 x 3457 = ?

Precisou de calculadora? Tudo bem… é um número grande mesmo e difícil de resolver de cabeça.

Agora vamos acrescentar um novo elemento na mesma equação. Resolva novamente.

3 x 5 x 10 x 4 x 27 x 3457 x 0 = ?

Não precisou da calculadora agora, certo?

Claro, porque aqui você aplica naturalmente uma lei da matemática. Todo número multiplicado por zero, é igual a zero.

Então não importa os números que vieram antes. Na presença do zero, o resultado é zero.

O zero, em um sistema multiplicativo, anula o valor de todos os outros números que estão na equação.

Bom, aqui começa a ficar claro o que quero dizer.

Agora você vai aprender a identificar muitas estratégias erradas no tratamento para os problemas com drogas…

A droga é o zero no sistema multiplicativo da dependência química

Vamos começar por um erro de pensamento muito comum sobre a dependência química:

Acreditar que são os problemas que levam o filho a usar drogas, e não o contrário.

Em grupos de mútua ajuda, combater esse entendimento é lei.

O que quero dizer com isso é que é preciso entender que:

Não são os problemas que levam ao uso de drogas, mas o uso de drogas que leva aos problemas.

Sobre isso, ouvi outra coisa interessante esses dias.

O adicto não tem problemas. O adicto cria os seus problemas.

Ok, por que é tão importante ter isso em mente?

Muitos pais chegam ao meu consultório com esforços enormes para dar condições melhores de vida para o filho para que ele não use drogas.

Pagam faculdades caras (para eles nunca irem), oferecem trabalhos em suas empresas (que se não fosse do pai ele já teria sido mandado embora faz tempo), dão roupas, computadores, celulares de primeira…

Para, no final, verem que o filho continua usando droga e no fundo não está nem aí para todos esses esforços dos pais.

E tudo isso motivado pela (falsa) esperança de que se ele se sentir melhor, não vai precisar mais usar drogas.

Será que isso funciona?

Vamos colocar na mesa a lógica por trás dessas ações:

“É a ociosidade, a falta de sentido, a baixa autoestima que leva meu filho a usar drogas. Então vou investir em melhorar essas coisas e, naturalmente, ele não vai mais precisar usar”

Não preciso dizer que nunca vi pais conseguirem resolver o problema seguindo esse caminho.

Você já viu?

O que acontece quando ignoro esse erro fundamental?

O resultado sempre é a sensação de existir um buraco negro que suga todas as energias investidas nessa tentativa de melhora.

Mas por que isso acontece dessa forma? Por que todos os esforços dos pais em melhorarem a qualidade de vida do filho viram pó? (desculpe a força de expressão)

Primeiro, porque NÃO são os problemas dele que levam ele a usar drogas.

Mas quero ir um pouco mais fundo nisso com você.

Vamos lá, veja essa equação:

Trabalho x Estudo x Esportes x Amigos x Espiritualidade x Afetividade = Vida plena de sentido

Nessa equação se aumentar o valor de cada um dos fatores presentes nela, o sentido da vida vai aumentar.

Agora se acrescentarmos a droga na equação…

Trabalho x Estudo x Esportes x Amigos x Espiritualidade x Afetividade x Droga (0) = Zero

Não adianta querer aumentar o valor dos fatores que dão sentido à vida, pois a presença da droga anula o valor deles.

É um sistema multiplicativo, lembra?

Mas como é tentador, quando se tem um filho usando drogas, querer resolver a vida toda dele na esperança de que, a vida dele melhorando, ele decida parar de usar.

Já investimos tanto…

Ele tem tanto potencial…

É tão inteligente, bonito…

Sempre foi tão bem nos estudos…

Mas o que é mais difícil de aceitar (e o segredo para solucionar o problema) é que tudo isso perde o valor com o uso de drogas.

Não adianta. Precisa encarar o problema de frente e ir na jugular dele, que é o consumo de drogas. Não outra coisa.

Pelo menos em um primeiro momento.

Pode ser ótimo aluno, ótimo filho, criativo, carinhoso, dedicado etc. um monte de qualidades que valem muito. Desenvolveu a dependência química: igual a zero. Não importa os valores enormes que vinham antes.

Então, é fundamental que todo o esforço seja primeiro para transformar o zero em um. Ou seja, tirar a droga da equação.

Conseguido isso, todo o esforço nos outros fatores voltam a fazer sentido e são fundamentais.

Portanto, o foco inicial do tratamento deve ser interromper o uso da droga

Isso não significa exigir que o paciente fique sem usar drogas para realizar o tratamento!

Sei que algumas mentes reducionistas podem concluir isso. Mas não, não faria o menor sentido.

Foco em interromper o consumo significa:

  • Fazer tudo para ajudá-lo a parar de usar em um primeiro momento
  • A família ter isso como seu foco principal de atenção
  • Direcionar todos os recursos terapêuticos para isso num primeiro momento

Colocar atenção em outras coisas torcendo para que ele pare de usar droga como consequência é uma ilusão.

Isso é válido para os profissionais também. Para o terapeuta individual, não adianta querer entrar em questões emocionais profundas, antes de ele ter conseguido lidar com o controle do seu consumo

Para o terapeuta familiar, idem. Não adianta querer trabalhar questões de complementaridade e modificar os padrões de interação da família, perdendo de vista o uso de drogas.

Em todos esses casos, acontece uma coisa interessante. Uma artimanha da dependência química…

Você vai ver todo o trabalho feito dando sinais de resultado. E vai pensar que está dando certo. Parece que está funcionando…

Mas na sequência, todos os esforços acabam sendo sabotados pela droga. E volta tudo para a estaca zero.

E não precisa ter pressa para eliminar de uma vez o consumo, mas precisa manter os esforços direcionados para isso.

Precisa trabalhar para que o zero se transforme em um, para permitir a manutenção do valor de todos os outros esforços.

Para a família, é tentador investir todas as energias possíveis para manter todos os pratos girando. O dos estudos, o do comportamento, o do trabalho etc.

Moisture Festival 2010, photo by Michelle Bates

Mas, acredite em mim, é uma energia preciosa desperdiçada.

Vale à pena sacrificar essas coisas em um primeiro momento (sim, apenas em um primeiro momento) para colocar toda energia na interrupção do consumo.

Às vezes os pais mantém o filho trabalhando na própria empresa para ele não ficar ocioso. Mas o filho acaba mais atrapalhando do que ajudando.

E continua usando droga.

Os pais seguem pagando a faculdade para ele não perder o ano e ter mais condições de futuro. Ele nem faz as provas. Vai perder o ano de qualquer jeito.

E continua usando droga.

Até onde vale o sacrifício de mantê-lo no emprego ou na faculdade dessa forma?

A mudança acontece quando este pensamento assume a mente dos pais:

“Assim não dá. Para tudo e vamos resolver essa questão com drogas primeiro. Deixa o resto andar naturalmente no ritmo possível, mas não vamos ficar nos matando para que ele tenha um trabalho ou passe de ano, se ele mesmo não está se importando com isso”

Aqui as coisas se organizam.

Aqui a matemática está sendo respeitada.

Enquanto o zero estiver ali, não adianta forçar o valor dos outros fatores.

É difícil agir assim? Claro, muito.

Por quê?

Simples. O primeiro pensamento que vem é “como assim eu vou deixar meu filho reprovar de ano e sair do trabalho? Ele vai fazer o que da vida daí? Aí sim que ele vai usar mais droga.”

Voltamos ao erro comum de pensamento: “são os problemas que levam meu filho a usar droga”.

Não!

A verdade é que o uso de droga que alimenta os problemas. É o uso de droga que tira o valor das outras coisas.

Por isso precisa resolver o uso. Então o caminho vai estar livre para investir no desenvolvimento de todas as outras coisas.

Quando a família consegue interromper o uso de drogas dele, aí sim o trabalho, os estudos e os outros elementos que contribuem com o sentido de vida vão ser essenciais e vão gerar frutos de verdade.

Depois que ele para de usar, é outra história.

(Um parênteses sobre) A regra é absoluta ou existem exceções?

Quando:

  • É o próprio usuário que está procurando ajuda e
  • O quadro não é de dependência, mas de uso ou abuso

O que observo é que, nesses casos, a droga pode não representar um zero, mas um número fracionado, que tende a zero (quanto mais se agrava o consumo, mais próximo de zero ela fica).

Ela normalmente diminui o valor das outras áreas da vida, mas ainda permite a existência e funcionalidade delas.

Ex. 43 x 55 x 12 x 198 x 0,8 (droga) = ?

A droga diminui o valor final da equação, mas não anula essa equação.

As drogas sempre estão em um sistema multiplicativo. E sempre vão representar o zero ou um número que tende a zero.

No começo do uso ela gera pouco prejuízo. É um 0,9 ou um 0,8. E conforme o consumo se intensifica vai tendendo a zero.

Entretanto, quando é a família que está procurando ajuda, normalmente a droga já está no lugar do zero, pois anula os esforços que a família faz para organizar a vida do filho.

Espero que tenha dado para sentir a importância que tem os pais desafiarem direta e abertamente o uso de drogas de um filho, antes de investir em ajudá-lo com as outras áreas da sua vida.

O maior vilão disso tudo é a anestesia que tanto usuário quanto família sentem, quando perdem de vista a dimensão do significado de usar drogas.

Subestimam o poder do zero, ficando cegos para ver por que todos seus esforços estão indo pelo ralo, para enxergar o porquê estão esgotados e se vendo quase sem esperanças.

Estão permitindo a permanência do zero em seu sistema multiplicativo.

Às vezes podem pensar que estão em um sistema de somatória, onde o zero simplesmente não acrescenta em nada. Mas não estão! Infelizmente, não estão.

Para guardar na memória e não perder de vista

Se uma única ideia tiver que ficar clara com esse texto, ela é a seguinte:

Todos os esforços de ajudar um filho a estruturar sua vida são sabotados pela presença da droga na vida dele.

Portanto, é fundamental:

Para que os pais possam ajudar de verdade, devem primeiro dedicar suas energias para interromper o consumo. Leve o tempo que levar.

Para entender isso, basta saber que os problemas com drogas estão dentro de um sistema multiplicativo em que a droga é o zero.

E enquanto o zero estiver ali, todos os outros elementos da equação são anulados.

E, como sempre, a pergunta do milhão é:

Como os pais conseguem eliminar a droga da vida do filho? Isso é possível?

Sim, claro que é. Se não fosse, eu não me dedicaria tanto a capacitar os pais para isso.

E se você quiser uma dica de por onde começar a se capacitar, dá uma olhadinha nos cursos online que criei, juntando as principais orientações que dou para pais no consultório.

>>> Conheça aqui o curso completo Filhos Sem Drogas

(Se você se inscreveu no curso introdutório “Como tratar meu filho dependente químico”, pode ignorar isso e espere receber as aulas, pois tem muita coisa bacana lá. No final vou te falar um pouco sobre o curso completo Filhos Sem Drogas)

Tenho certeza de que você vai se surpreender com o poder da família para resolver os problemas com drogas de um filho.

Um abraço e até logo!

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2 Replies to “O que a matemática pode te ensinar sobre como lidar com o problema de drogas do seu filho”

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vera

maravilhoso estou com muita Fé e vontade de vencer

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Marcia Nava

Excelente! Abre os nossos olhos! Vou fazer o curso!!!